26.1.10

(Conto): A INCOMUNICABILIDADE


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A primeira linha é sempre a mais difícil. Começo por onde? Começo a linha dizendo que meu nome é H. S. EDGAR. Por que? Por que eu quero, ué? A segunda linha diz: Onde eu estou? Estou em um quarto. Um quarto escuro, sentado em uma cadeira de balanço, que range cada vez mais alto. Este som bate nas paredes e ecoa. Por horas eu estou aqui, me pergunte “por que” e eu responderei que é a única opção, um quartinho nos fundos. O único móvel, uma cadeira. Dinheiro. Eu o resisti o quanto pude, mas ele fala baixo no meu ouvido: você precisa de mim, você precisa de mim. Está certo! Tudo bem, eu preciso, mas eu pintei todas as paredes que poderia pintar, todos os rodapés que encontrei. Não existem mais paredes que precisam de mim. Mas será que o único trabalho que posso fazer é pintar paredes? Foi isso que eu escolhi ou escolheram pra mim? Essa linha me confunde. Seria mais fácil se eu pensasse na 3ª pessoa e não na 1ª .
Aquele jovem negro chamado H. S. Edgar, não sabe fazer mais nada além de pintar paredes. Todas do pequeno cubículo em que dorme, já pintou 5 ou 6 vezes. As luzes estão apagadas agora (o leitor não pode vê-lo). Edgar está sentado em uma cadeira de balanço antiga, que faz um barulho irritante, os vizinhos já reclamaram antes, não tem nada para se fazer a não ser pensar. Só pode pensar em si, infelizmente não possui amigos. “É uma pena”. Ele repete muito essa frase sussurrando.
Mas aí ele se lembra de que neste pequeno cômodo que mora possui uma janela. Que fantástico! Há o que ele pode fazer, não importando o que irá encontrar do outro lado, será uma surpresa, uma nova perspectiva. Ele esbouça um sorriso. Levanta rápido da cadeira. Mesmo no escuro ele sabe onde ela fica.
Por que nunca pensei em abrir essa janela antes em dez dias que moro aqui? Essa linha vai ser a melhor de todas... eu posso ser a 1ª pessoa sempre!
Edgar abre a janela de uma vez. Seu sorriso acaba tão rápido quando percebe que não há luz, continua a escuridão. Ele põe a mão a frente para ver o que bloqueia a claridade. As pontas de seus dedos tocam uma fria e áspera parede.
Preciso terminar logo essa linha, há o que fazer... ele pensa.


(Gilberto Caetano)

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