Aquela umidade que alivia os pulmões. Os caules. O orvalho
escorregando na folha. O cheiro da terra. Raízes. Insetos. Uma chuva que cai
rapidamente e vai embora sem se despedir. Os olhos pretos deste homem que
apenas refletem o verde da grama. O silêncio inexistente da mata.
RUBENS MELO BATISTA foi um homem criado entre
os homens. Cabra-macho. Pesquisou entre aqueles estudiosos. Tinha que
ser um doutô. Tinha que falar e escrever corretamente. Mas ele via
apenas concreto e poeira circulando por aí. Multidões como ele sem ter o que
viver e vivendo entre pecados capitais, isso cansa. Assim cansado, Rubens vive
aprendendo em outro lugar. Distante de tudo, conhecido como o Loko-do-mato como
dizem os que pensam que pensam mais que ele.
Humildemente ali, sozinho, conversando com a mãe Terra quando
coloca seu ouvido sobre a grande pedra ao lado do rio, na extremidade do
pequeno mundo perto do frio do longo Outono. Ali, as estações não fazem tanto
sentido assim. A grama fica amarela. O Sol raro. Todos estes dias têm medo do
Sol. O astro poderoso agora pode fazer o que quiser.
Rubens abre os braços. Na sua direita está a floresta e
na sua esquerda o mar. Ele abre os braços não em sacrifício como O Filho, mas
de reverencia. Sentir o calor da tempestade solar que se aproxima e destrói
tudo aquilo que era eletrônico. Os mamíferos aquáticos dali não usam laptop. A
ave-rei-de-cabeça-branca não usa celular. Os lobos cinzentos não precisam de
chuveiro elétrico. Tudo que é eletrônico no mundo se vai.
Como todos tinham medo, finalmente acontece. Para Rubens e outros
povos da floresta é apenas um clarão, para o resto do planeta civilizado é uma
grande merda.
O homem feliz construiu sua casa em cima das árvores e
espera todas as noites acordado pelo vulto de Ártemis caçando. Quem sabe trocar
uma ideia. Depois desta tempestade solar, não há mais guerras, contas e sacerdotes
virtuais. Ela veio rápida e acabou com todo o mundo.
Caos.
A única luz existente durante a noite é a do fogo e de pequenos
seres invertebrados que piscam. A humanidade agora é oficialmente sem utilidade.
Para ele é hora de redescobrir outro mundo. Azul, frio e ainda cheio de vida.
Um novo mundo onde pode haver respeito. Rubens toca a escama de um grande peixe
que lhe ensina a não agredir seus semelhantes. Ajudar a construir uma harmonia.
O planeta voltando a ser azul invés de cinza. Ele é feliz por ter se escondido
na floresta antes da tempestade. Aproveita cada gosto deste mundo, deixando o
próximo para depois. Pisando novamente na grama amarela. Ainda sozinho. Mas
dormindo entre os corpos dos deuses.
Sorte de Rubens que se isolou, perdeu sua sanidade convencional
antes da tempestade solar que inflige o mundo eletrônico e tudo que há nele.
(Gilberto Caetano)
...